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Cahiers antispécistes n°0 -

A igualdade animal

Tradução Juliana Marques; revisão: Marley Prestes

A Igualdade Animal É difícil argumentarmos uma evidência, pois tudo que podemos dizer antecipadamente é supérfluo. Se uma frase tautológica é incapaz de convencer por si própria uma pessoa sensata, então que argumento, que outro desenvolvimento poderiam convencê-la? Temos dificuldades em argumentarmos sobre a posição da igualdade animal não por causa de sua complexidade, mas ao contrário, porque a sentimos como sendo de ordem tautológica.

A tese anti-especista é esta: os interesses iguais são iguais. A igualdade que ela defende, é a afirmação que, se dois seres são portadores de interesses da mesma grandeza, da mesma importância, então os tais interesses são igualmente importantes, de mesma grandeza; independentemente de qualquer outra característica possuída por esses seres, da cor de sua pele ou da sua inteligência.
Podem discutir o significado da palavra interesse; para mim este significado abrange o interesse que todo ser sensível tem de não sofrer, ter alegria, felicidade e, por causa disso, continuar vivendo. Podem contestar, talvez, a identidade que eu sugiro existir entre o tamanho e a importância de um interesse. A importância de um interesse, é a força deste. Essa importância depende da intensidade e da duração do sofrimento que deve ser evitado, ou o do prazer que deve ser provocado; ela não depende diretamente da inteligência do ser em questão, nem do número dos seus cromossomos. E um interesse que tem importância é, exceto em caso de paralisia, um interesse que impulsiona a agir. O tamanho de um interesse corresponde assim à importância que lhe é dada quando uma decisão vai ser tomada.
Se em nossos atos levarmos em conta os interesses alheios, isso não é feito em função de nossos interesses – senão, seriam ainda nossos interesses que nós estaríamos levando em conta. Se declaramos ser justo o fato de levarmos em conta um interesse que não seja o nosso, isso apenas pode ser feito por se tratar de um interesse e não em função da relação que temos com o interlocutor cujo interesse está em jogo. É isto que torna injusto o racismo e o sexismo. Um ato não pode ser considerado justo ou injusto levando-se em conta o fato do autor do ato e daquele que o sofre pertencerem ou não ao mesmo grupo. Não é o fato de ser branco, ou de eu falar sobre um Branco, que pode de repente tornar verdadeira a proposição: «É justo rebaixarmos os Negros à escravidão». E é da mesma maneira injusto o especismo. Não é o fato de sermos humano, nem de termos como interlocutores no senso próprio os humanos, que pode tornar justa a escravidão dos não-humanos.

Entre os animais: os humanos. Sendo assim, duas conseqüências, relativas à igualdade animal:
1. Os interesses de todos os animais não humanos devem ser levados em conta com a mesma intensidade como se fossem dos humanos. Nós não pedimos que se leve em consideração os interesses não humanos dentro dos interstícios dos interesses humanos. Nós pedimos igualdade.
2. A igualdade animal implica a igualdade humana, e os interesses de todos os humanos devem ser levados em conta da mesma forma, sejam eles brancos ou negros, homens ou mulheres, nascidos em países desenvolvidos ou do Terceiro Mundo; o que está longe de ser o caso ainda hoje. Mas os anti-especistas não devem se justificar a cada instante explicando sempre que “também” se preocupam com os humanos. Ninguém pergunta a quem luta pela igualdade dos negros americanos «O que você faz pelos Kurdos?», nem «O que você faz pelas galinhas?».

A luta anti-racista tem gastado muito tempo e energia querendo demonstrar a igualdade efetiva da inteligência, ou da capacidade de trabalho, ou da capacidade cultural, dos diferentes tipos de seres humanos ao ponto de fazer as pessoas acreditarem que a igualdade que elas reivindicam esteja nisso.
Nestas páginas as pessoas encontrarão poucos elogios à inteligência dos «bichos». Nós não diremos, como muitos outros, que «afinal de contas», eles são mais, ou também, inteligentes como nós. Nosso objetivo não é este.
Não podemos supor que os Negros devam ser respeitados tanto quanto os Brancos porque são também tão inteligentes quanto eles, sem sugerir que os humanos menos inteligentes mereçam desprezo. Não podemos reivindicar fundarmos a igualdade das raças ou dos sexos humanos no fato destes grupos possuírem igualmente qualquer capacidade que seja, sem justificarmos a discriminação contra os humanos que possuam tais capacidades em um menor grau. O anti-especismo se opõe ao desprezo, e luta por uma justiça que não seja nem do mais forte, nem do mais inteligente.

E as plantas? A igualdade de A e de B não é contradita pela afirmação que C, também, é igual a A e B. Assim como a igualdade animal não contradiz a igualdade dos humanos, a igualdade dos seres vivos não contradiria, se fosse verdadeira, a igualdade animal. Entretanto, «as plantas» são freqüentemente enunciadas como objeção à nossas teses. Trata-se, na realidade, de um argumento ad hominem; a igualdade entre os seres vivos parece amedrontar e é desencorajada, pela dificuldade que geraria, pois teríamos que nos comportar em conseqüência dela. O valor argumentativo da objeção é inválido, ainda que seu valor psicológico possa ser forte.
Tendo dito isto, acrescento que eu não creio na igualdade dos seres vivos; ou, mais exatamente, eu acredito na igualdade da importância dos interesses de mesma grandeza de todos os seres que tenham interesses, mas eu não creio que as plantas, ou as bactérias, por exemplo, tenham interesses; eu não as creio capazes nem do prazer nem do sofrimento, eu creio inválida a grandeza dos seus interesses. Eu não as desprezo; acho somente que elas não são visadas por nossos atos.
Não quero aqui argumentar isso; a questão da sensibilidade das plantas é importante, mas técnica, como é, por exemplo, a dos critérios de não-sensibilidade de um humano em coma irreversível. Podemos substituir dentro do meu discurso «animais» por «seres que têm interesses»; para mim o sentido não é alterado.

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